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O escritor moçambicano Mia Couto é considerado hoje um dos principais nomes da literatura em língua portuguesa. Com premiações nacionais e internacionais, publicações em diversos gêneros e países, sua obra é lida e estudada por um número significativo de pessoas ao redor do mundo. Atento ao trânsito de sua escrita e à potência do texto
literário enquanto possibilidade de escuta do outro (COUTO, 2011), sua obra subverte silenciamentos da História e (re)elabora narrativas que representam sujeitos subalternizados, invisibilizados e estereotipados. Considerando esses aspectos como característicos do autor e da própria literatura moçambicana como sistema (NOA, 2009), esta tese desenvolve-se a partir da hipótese de que As Areias do Imperador: uma trilogia moçambicana proporciona à leitora/ao leitor da narrativa ocupar um lugar de escuta, em um movimento de suspensão de si e acolhida do outro silenciado, deslocando-se entre diversos silenciamentos contra os quais a narrativa se insurge. Composta pelos títulos Mulheres de Cinzas (2015), Sombras da Água (2016) e O Bebedor de Horizontes (2018), a série dialoga com o contexto histórico de disputa territorial entre a Coroa Portuguesa e o Império de Gaza, comandado por Ngungunyane, ocorrida entre os anos finais do século XIX e iniciais do século XX, na parte sul de Moçambique. Narrada por diferentes vozes, a trilogia é conduzida predominantemente pelas narrativas e narrações de Imani Nsambe, jovem africana da tribo VaChopi, e Germano de Melo, soldado lusitano das Forças Oficiais Portuguesas. Por meio de relatos e cartas, as escritas dos narradores partem da margem (hooks, 2019; KILOMBA, 2020) e falam sobre as condições da vida na fronteira (SANTOS, 2011), compartilhando suas experiências de subalternidade e silenciamento, lidas neste trabalho em aproximação às produções deKilomba 2020), NOA (2009), Orlandi (2007), Said (2001), Santos (2010) e Spivak (2010).
Com a potência de fazer a leitora/o leitor transitar pelos corpos e experiências dos seres
ficcionais (BERARDINELLI, 2007; JOUVE, 2002), e considerando o movimento de
cooperação textual (ECO, 1986; 2005), identifico que a trilogia constitui-se por meio de
movimentos de escuta, desde o processo gerativo do texto, encontrando exemplaridade nas interações entre as personagens e encaminhando para a constituição de um leitor que amplia a própria experiência no contato com o outro que o chega via texto literário. Escrita e leitura como escuta do outro. Especialmente do outro invisibilizado, silenciado, sujeitado, subalternizado, que foram colocados à margem da História. |
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